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quinta-feira, 6 de fevereiro de 2025

Rafiki

Assisti Rafiki (2018) de Wanuri Kahiu no TelecinePlay. Tem um tempo que eu vejo esse filme no Telecine, mas não com esse lindo cartaz. Se fosse eu já tinha visto faz tempo. É bem feio o cartaz que está por lá!

É a história de amor entre duas jovens. Achei que o filme ia falar da rivalidade política, já que os pais delas são candidatos rivais. Mas comecei a estranhar os diálogos, fui pesquisar e levei um choque. Sei que há muitos países que criminalizam o amor entre pessoas do mesmo sexo, mas nunca imaginei que o Quênia seria um deles. Há anos os quenianos são os vencedores na Corrida da São Silvestre, vejo tantas entrevistas, nunca imaginei que eles fossem de um país tão retrógado e preconceituoso. O país inclusive baniu o filme do conselho do Quênia "devido ao seu tema homossexual e clara intenção de promover o lesbianismo no Quênia, contrário à lei". Uma pessoa condenada por ter amor por alguém do mesmo sexo pode ser preso por 14 anos no Quênia. Tanta violência no mundo, inclusive no país, mas eles estão preocupados com quem uma pessoa beija na boca. A corajosa diretora processou o governo queniano.
Como são lindas Samantha Mugatsia e Sheila Munyiva, além de excelentes, que atrizes. E como são corajosas também, falar de amor em um país que o proíbe e o pune é muito revolucionário. Apesar das personagens viverem em Nairobi, uma das maiores cidades do país, a comunidade que elas estão inseridas é bem provinciana. Um toma conta do outro para praguejar e fazer mal, jamais para construir. A protagonista é brilhante, e é sua amiga que a faz entender que pode ser mais que enfermeira, que pode ser médica com as notas que tem e é o que ela faz. Apesar da comunidade quase matar as duas jovens, vários batendo nelas, elas que são presas. Conseguem ser soltas pela influência de seus pais. Nada acontece com os que quase as mataram. Como disse, a violência contra os seus semelhantes é aceita, o amor não.
Beijos,
Pedrita

terça-feira, 19 de julho de 2022

Um Grão de Trigo de Ngugi Wa Thiongo

Terminei de ler Um Grão de Trigo (1967) de Ngugi Wa Thiongo da Alfaguara. Esse livro é muito comentado no Brasil, já figurou nas listas de mais vendidos, quando teve uma feira de livros virtual recente, adquiri. Excelente! O autor é queniano, atualmente é professor em uma universidade nos Estados Unidos. Essa belíssima capa é de Celso Longo.

O marcador de livros é da Livraria Cultura.
 

Obra Labirintos de Jeff Xclusive

O livro começa com duas pessoas procurando Mugo. Querem que ele discurse em homenagem a um revolucionário morto no passado. O livro passa então a misturar os tempos e contar as histórias desses amigos, sua adolescência e a ditadura.
Obra Amo Liberdade de Miguelle Mahuton

O livro mostra como um sistema opressor destrói as relações. É muito difícil sobreviver e manter a dignidade seja sob tortura, violência, medo ou fome. A colonização faz o que pode para desestruturar e desqualificar todas a cultura do povo originário. É projeto de governo deixar faltar tudo, segurança, alimentos, dignidade. Prender e torturar. Cada um vai sobrevivendo como pode, nem sempre com dignidade, porque é muito difícil lutar contra o desmonte, contra a maldade. É doloroso ver a juventude deles, os sonhos, e depois eles sobrevivendo como podem, com os caminhos tortos que escolhem, desolador.
Obra de Michael Musyoka

A qualidade do texto impressiona, tudo é milimetricamente tecido e ordenado. Espantoso! É tudo muito profundo, nada é didático. As vidas vão tecendo as tramas e nas entrelinhas as destruições dos laços.


Beijos,
Pedrita

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Infiel

Terminei de ler Infiel de Ayaan Hirsi Ali. Eu comprei esse livro na Bienal do Livro no ano passado porque tinha lido várias matérias e queria muito ler. Essa edição é da Companhia das Letras. Logo no início eu já me surpreendi. Na década de 50 a avó de Ayaan vivia na Somália nos clãs, mudava sempre de lugar, viviam sempre embaixo de árvores. É muito recente para me deparar com pessoas que viviam em clãs. A mãe de Ayaan se casa como muitos no país, com casamento arranjado e surpreendemente, depois de ter um filho, pede o divórcio e vai viver na capital da Somália. Lá conhece o pai de Ayaan, se casa, tem duas filhas. O pai de Ayaan era um revolucionário e com as mudanças políticas no país vai preso. Como a mãe de Ayaan teme pela segurança de todos, resolve ir viver com a mãe, começam então o calvário de todos. Esse clãs que têm aqueles rituais monstruosos como a excisão do clítoris, fiquei mais horrorizada ainda que eles custaram as mulheres, deixando só o espaço para a urina. Isso acontece com Ayaan e a irmã, em uma festa, quando Ayaan tinha 5 anos. Sua mãe era contra, mas como a mãe viajava muito, a avó apronta essa monstrusidade como se estivesse fazendo o bem as crianças.

Depois a mãe e as filhas começam a viajar para viver com o pai. Moram na Arábia Saudita e no Quênia. A mãe começa a ficar
amarga e a espancar muito as filhas. É horrível como a mulher é tratada nesses países, a submissão já incomoda, mas se fosse só isso podíamos até suportar a cultura de um país, mas a violência física que sofrem é assustadora. Se uma mulher é estuprada pelo irmão, a culpa é da mulher. Homens podem espancar suas mulheres, se acharem que elas merecem. Ayaan é tão espancada por um professor do Alcorão e pela mãe que tem que ser hospitalizada com uma lesão séria no cérebro. Apesar de todos esses horrores, é a irmã dela que se rebela mais.
Ayaan na adolescência abraça o Islamismo, cobre seu corpo, mas com os ensinamentos começa a questionar as ordens e obediência às mulheres e começa a não entender porque os homens não devem obediência também. Ela tem um casamento arranjado com um marido no Canadá, mas a família não consegue visto que ela vá direto ao país. Seria mais fácil conseguir o visto para a Alemanha e depois por lá ir para o Canadá. Vai para a casa de uns parentes na Alemanha e lá
começa a planejar a sua fuga.


Começa a segunda parte do livro. Não deve ser fácil fugir. Além de serem amaldiçoadas pela sua fé, a família também e é preciso cortar os laços. Esse deve ser o motivo que muitas mulheres se submetem, porque não é fácil virar as costas para o seu passado, abandonar irmãos, pais, saber que eles sofrerão represálias em seu país. Não é uma decisão fácil. Ayaan se refugia na Holanda. A quantidade de imigrantes de outras nacionalidades no país na época é assustadora. Ela acaba trabalhando como intérprete e começamos a conhecer outros povos, outras situações complicadas. Aos poucos Ayaan começa a dizer o que pensa e é jurada de morte. Na Holanda ela foi classificada com QI baixo, mas insistiu em tentar se formar em política. Foi contra as determinações da imigração e conseguiu ingressar em uma universidade. Chegou ao Parlamento holandês. Hoje ela vive nos Estados Unidos. Infiel aborda várias questões, Islamismo, violência a mulher, imigração na Europa, política e o papel da imprensa que muitas vezes se aproveita de temas controversos pra fazer sensacionalismo. Ela escreveu um outro livro que agora quero ler e a Carla Martins comentou no blog dela, Leitura (mais que) Obrigatória.

Anotei vários trechos de Infiel de Ayaan Hirsi Ali, vou selecionar alguns:

“Nasci em um país dilacerado pela guerra e fui criada em um continente mais conhecido pelo que dá errado do que pelo que dá certo. Nos padrões da Somália e da África, sou privilegiada por ainda estar viva e sã, privilégio que não posso nem nunca vou poder considerar líquido e certo, pois sem a ajuda e o sacrifício de familiares, professores e amigos, nada me distinguiria das minhas semelhantes que apenas lutam pra sobreviver.”
“Há a mulher açoitada por ter cometido adultério; outra entregue ao matrimônio a um homem que ela detesta; outra espancada regularmente pelo marido; e outra que o pai repudiada ao saber que o irmão dela a estuprou. Os perpetradores justificam cada abuso em nome de Deus, citando os versículos do Alcorão agora escrito no corpo dessas mulheres. Elas representam centenas de milhares de muçulmanas em todo o mundo.”

“A desconfiança era recomendável, principalmente para as meninas. Pois elas podiam ser roubadas. Ou podiam ceder. E aquela que perdesse a virgindade manchava não só a própria honra como a do pai, dos tios, dos irmãos, dos primos. Não havia nada pior do que ser agente de semelhante catástrofe.”
"A mutilação dos órgãos genitais da mulher é anterior ao Islã. Nem todos os muçulmanos adotam essa prática, e alguns povos que a adotam não professam o islamismo. Mas, na Somália, o procedimento sempre se justifica em nome do Islã."


Youtube: Roda Viva - Ayaan Hirsi Ali




Beijos,

Pedrita