domingo, 6 de setembro de 2015

Que Horas Ela Volta?

Assisti no cinema Que Horas Ela Volta? (2015) de Anna Muylaert. Queria muito ver esse filme desde que vi matérias quando era realizado. E mais ainda quando começou a chamar a atenção nos festivais internacionais e ganhar prêmios. Estranhamente aqui no Brasil ficou fora da competição no Festival de Gramado, passou em uma sessão especial, mas não concorreu. Confesso que não entendi porquê. E é simplesmente maravilhoso! É tudo o que dizem e mais um pouco.

A personagem da Regina Casé mora e trabalha no emprego. Sem função definida. Foi babá do garoto, mas acumula as funções de cozinhar, arrumar os quartos, regar o jardim, servir à mesa e nas festas. Estranhei no fato dessa família parecer que tem problemas de locomoção. A empregada é chamada para tudo, até mesmo para trazer um simples copo d´água. O adolescente que ela cuidou deixa do lado de fora do quarto, no chão, um prato e um copo do que comeu e bebeu, como se estivesse em um hotel e não pudesse ir as outras dependências. Nunca exploramos assim a minha família. Nunca deixamos copos pela casa. Assim que podíamos levar os pratos na pia, depois dos 4 anos, o fazíamos. E quando ficamos maiores cada copo usado tinha que ser lavado. Não ficavam copos na pia. Todos tinham funções na casa, independente se no período tínhamos alguém que limpava a casa. Eu estranho muito essa educação que cria reizinhos que não fazem nada em casa. A filha dessa empregada precisa vir para São Paulo para prestar vestibular e vai morar na casa dos patrões da mãe. A mãe começa finalmente a perceber a relação de servidão e abuso em que está inserida. Que Horas Ela Volta? não é um filme panfletário, são as sutilezas que mostram ao público e a essa empregada os abusos. O roteiro é muito inteligente. A empregada comete aquele erro básico de muitas brasileiras, ela se incomoda que abram a geladeira, é dela, ela que decide o que sai e entra ali.

Aparentemente os patrões são bacanas, a empregada é "como se fosse da família", mas sempre até a página dois. O tempo todo a empregada é lembrada de qual é o lugar dela e consequentemente o da filha. Incrível como essa família já julga a filha da empregada e duvida que ela seja capaz de entrar em um curso da elite, arquitetura e em uma faculdade como a USP, que é para quem estudou em bons colégios. Eles julgam a menina assim que ela chega e vão se surpreendendo em perceber como a menina é informada, diferente do filho da casa que também vai prestar vestibular, mas que ainda parece um adolescente. A menina é mais madura. Eu imagino que esse filme venha encantando a Europa pela questão dos imigrantes por lá. Embora a relação doméstica seja diferente na Europa, não tenham empregadas nesse formato, boa parte dos serviços domésticos são realizados por imigrantes ilegais que ficam praticamente invisíveis nas casas que trabalham.
Eu acabei vendo em um shopping onde tinha desconto do Vivo Valoriza e me surpreendi com os comentários no início. Uma moça disse "folgada" se referindo a filha da empregada. Só depois do meio do filme que os comentários cessaram e ficou um silêncio constrangedor. Regina Casé simplesmente arrasa, mereceu todos os prêmios que ganhou e que venham outros. Gostei de todo o elenco. Não conhecia a menina que faz a filha da empregada, interpretada pela Camila Márdila. Gostei muito do Lourenço Mutarelli fazer o pai, gosto dos textos dele e ele está ótimo como esse pai que perdeu a função na família, que tem uma esposa dominadora e está claramente entediado. O garoto é interpretado pelo Michel Joelsas, eu adoro esse ator desde O Ano em que meus pais saíram de férias.  A mãe é interpretada por Karine Teles. A faxineira que ajuda a empregada é interpretada pela Helena Albergaria. Amei os cachorros.

Vários atores fazem participações: Luis Miranda, Theo Werneck, Luci Pereira, Alex Husznar e Joyce Pascowitch. A trilha sonora é do Fábio Trummer, líder da Banda Eddie que tem duas canções no filme. Que Horas Ela Volta? ganhou Prêmio do Júri no Festival de Sundunce 2015 prêmio da Confederação de Cinemas de Arte e Ensaio na seção Panorama do Festival de Berlim.


Beijos,
Pedrita

15 comentários:

  1. Resenha maravilhosa amei a dica do filme não assisti ainda
    Canal:https://www.youtube.com/watch?v=EgeQXJjUpSQ
    Blog: http://arrasandonobatomvermelho.blogspot.com.br

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  2. Preciso ver esse filme.... é o tipo de filme que amo!

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  3. Este eu também quero ver. E já queria antes de saber dos abusos sofridos pela pobre empregada.

    Beijoca e boa semana

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    1. marly, eu já acompanhava desde que começaram a fazer o filme e o canal brasil fez matérias.

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  4. Não tenho interesse me vê porque não gosto de Regina Casé. Nada do que ela fez, até o momento, eu eu vi(pouca coisa), gostei.
    Penso que a filha que tem uma educação, diferente da empregada, já chega achando que ela é submissa demais(no trailer).
    Nos Estados Unidos nem existe esse tipo de empregada(tempo integral).
    E se ela tinha tempo integral era porque interessava a ela, empregada.

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    1. liliane, regina casé está maravilhosa. e amo a regina naquele outro programa maravilhoso, um pé de quê?. a filha conta que um professor de história a levou a ter uma visão mais crítica e ter interesse por se informar mais e ler. achei lindo no filme ser um professor o responsável por ela ser tão informada. esse tipo de empregada é um formato cultural tão arraigado q muitos nem percebem a escravidão inserido neles. por sorte esse formato vem acabando até mesmo pela questão financeira.

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  5. Esqueci de dizer. Li alguns livros de Stephan Zweig sem nem saber quem era, na minha adolescência.
    Porque minha tia-madrinha ia comigo na Biblioteca e tirávamos.
    O documentário que vi tinha pessoas falando nele. Pessoas que conviveram com ele.
    Inclusive comentam do que pode ter sido a causa do suicídio.
    Agora o que vi ontem: "O prussiano de Osasco", um horror. Não descobri o nome do homem nem em que trabalhava.
    Passava 2,5 h no ônibus para ir trabalhar na ida e mais 2,5 h na volta.

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  6. Pedrita, tenho muita curiosidade em assistir ao filme. Me parece exagerada esta realidade do filme, de colocar a emprega como praticamente uma mucama e que eles não podem fazer nada, nem levar um copo na cozinha. É bizarro. Beijos

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    1. patry, eu vi muitas mães fazendo isso do copo, dos pratos. tirando as roupas jogadas do chão. catando copos pela casa. é muito bizarro realmente.

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  7. Ainda não assisti, mas parece bem interessante essa forma de retratar a classe média.

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  8. Só tenho lido críticas positivas sobre esse filme. Preciso ver!

    bjus

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    1. marcelo, já li algumas negativas. o filme é muito bom.

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