terça-feira, 18 de novembro de 2025

Arrastados de Daniela Arbex

Terminei de ler Arrastados (2022) de Daniela Arbex da Intrínseca. Sabia que não seria uma leitura fácil, mas acho fundamental não esquecermos dessas tragédias para pressionar por responsabilidades. Há ainda inúmeras barreiras de rejeitos em risco, que esse horror nunca se repita. 

O marcador de livros é em feltro e lã.

Eu gosto muito como a jornalista escreve e seu apuro investigativo. Ela começa a obra no dia do rompimento da barragem, 25 de janeiro de 2019 com os funcionários se dirigindo ao trabalho, pegando o ônibus, encontrando os colegas, encomendando pastéis com o colega do ponto adiante, falando dos seus trabalhos do dia. E vai mostrando outros funcionários, o que iam fazer. Os trabalhadores falam o tempo todo dos inúmeros protocolos que dão a falsa sensação de segurança.
Até que a barragem se rompe e em minutos vai arrasando tudo. Os bombeiros começaram a ir de onde estavam ao local, depois outros bombeiros de outros estados também seguiram pra lá. Os bombeiros de Minas Gerais estavam com os salários atrasados, mas mesmo assim foram incansáveis. Com salários baixos, muito menos do que a função perigosa merece, nem o pouco que recebem é honrado. Enquanto os que distribuem as verbas só enriquecem. Eu acompanhei pela televisão esse resgate de helicóptero, é uma mulher que está sendo resgatada. Procurei inclusive o vídeo. Foi a TV Record que filmou enquanto eles tentavam tirar a mulher repleta de rejeitos, que escorregava. Chorei de novo. Os rejeitos faziam os acidentados pesarem muito mais, além de escorregarem. Foi muita agonia. Eu sofri demais com a leitura. Em um determinado momento eu resolvi ir até o fim de uma vez, terminar logo, para acabar logo aquele sofrimento. Passei então finalizando o livro no fim de semana.
Eu acompanhei muito na época as investigações, e o livro se aprofunda ainda mais. Em junho de 2018, a empresa que fez a avaliação para dar o laudo disse que estava longe do aceitável. A barragem tinha que ser interditada imediatamente para ações de contenção. A Vale se recusou, usou o laudo anterior que está aceitável e continuou os trabalhos. Descobriu-se depois que duas empresas antes se recusaram a dar o laudo que estava aceitável e foram trocadas. Na avaliação, avisaram que os rejeitos cobririam as regiões rapidamente, que o administrativo e o refeitório seriam soterrados, No dia 25 ao desastre, era hora do almoço, e o refeitório estava lotado, todos morreram. Em 2018, a Vale ignorou, colocou o laudo como aceitável e continuou trabalhando, não podiam parar os trabalhos e as extrações. A jornalista conta também a enxurrada de indenizações que geraram um número enorme de moradores de Brumadinho que surgiram se dizendo ser do local. E vidas não se indenizam. Até hoje a flora e a fauna contém alto índice de rejeitos de minérios, tudo foi destruído. 270 pessoas morreram, algumas levaram anos pra ser encontradas, ainda há desaparecidos. O livro fala do trabalho do IML, da dificuldade em descobrir quem eram as pessoas. Com o tempo ficou pior, porque só se achavam pedaços. Agora mesmo há uma investigação internacional de uma das empresas que trabalham com a Vale. Vi uma entrevista de um acusado dizendo que já tinha sido realizada no Brasil, não tinha sentido ser feito fora do país. Ah, nenhuma investigação será suficiente. E a impunidade no Brasil é notória. Sabiam e mataram 270 pessoas, só pagaram indenizações, os responsáveis não foram presos. A lei no Brasil não é igual para todos.
No último capítulo, Daniela Arbex conta como chegou até escrever o livro. Ela é de Minas Gerais, vivia em Juiz de Fora e no dia do rompimento da barragem seguia para o Rio Grande do Sul porque escrevia o livro da Boate Kiss. No caminho começou a receber uma enxurrada de notícias de Brumadinho. Voltou para Juiz de Fora, falou com o jornal impresso que trabalhava, mas já era época do fim dos jornais e não tinham recursos para enviá-la a Brumadinho. Familiares de vítimas da Boate Kiss ajudaram nos custos e ela seguiu para Brumadinho. Fez a primeira matéria com foco nos familiares que aguardavam informações de seus entes queridos. Os familiares nunca aceitaram a palavra desaparecidos, porque todos sabiam onde eles estavam, embaixo da lama de rejeitos. Pelo livro da Boate Kiss, Daniela falou com a Intrínseca, disse que estava em Brumadinho e eles disseram que só ela poderia relatar o ocorrido e fazer um livro. Um ano depois veio a pandemia, ainda tinham corpos sem localização. Ela tomou todos os cuidados, mas continuou o trabalho. Até saber que seu irmão, sobrinhos, estavam com Covid. Uns dias depois todos estavam bem, exceto seu irmão, saudável e jovem, foi hospitalizado, intubado e morreu 8 dias depois. Lidando com o luto, ela passou a sentir mais ainda a indignação dos familiares e focou muito o livro no relato dos irmãos pela trágica sinergia que passou a sentir. Daniela e o irmão eram muito unidos, se apoiavam profissionalmente. Ele chegou inclusive a fazer o documentário do livro Holocausto Brasileiro que comentei sobre o livro aqui.
Ao final, o livro traz a lista dos 270 mortos e suas profissões.
Desde o desastre de Mariana e suas impunidades eu acompanho matérias sobre o tema. Só recentemente, dez anos depois, é que os desabrigados de Mariana receberam suas casas. Iguais aqueles condomínios pavorosos que vimos em Central do Brasil. Mariana era uma área rural e a cidade fantasma é urbana, sem nada em volta, só casas.
Sobre o desastre de Mariana tem aqui o texto do documentário Vozes de Paracatu e Bento da GloboNews.
Sobre a mineração, suas impunidades e destruição do meio ambiente tem o documentário Lavra.

Beijos,
Pedrita

domingo, 16 de novembro de 2025

A Casa de Dinamite

Assisti A Casa de Dinamite (2025) de Kathryn Bigelow na Netflix. Eu ouvi muito burburinho sobre esse filme, resolvi ver. Amei! O mais interessante é que fui olhar algumas críticas e teve quem amou como eu e quem odiou, quase na mesma proporção.

Eu gosto demais da Rebecca Fegursson, ela é a protagonista da primeira parte. Começa ela chegando ao trabalho na Casa Branca. Impressionante todos os sistemas de segurança. Claro, passam os objetos por detectores de metais como os de aeroporto. depois cada um coloca o celular em um dispositivo com chave, só aí entram no local de segurança máxima. É protocolo que não acaba mais. O filme passa três vezes o mesmo momento, com destaque para cada protagonista diferente. Então o primeiro é na Casa Branca, depois com o secretário de Jared Harris e no último com o presidente. O sistema vê um arremesso, tentam interceptar duas vezes sem sucesso e começa a contagem regressiva para o ataque atômico acontecer em Chicago. Começa a contagem quando chega em zero, começa o filme do mesmo ponto do começo desse bloco, mas com outro protagonista.
Nessa parte, um homem tem que substituir outro de surpresa na ligação com os líderes militares. Ele faz tudo correndo. Ele é Gabriel Basso. Em um desses blocos uma mulher está de folga e é absurdo o que ela está fazendo com o filho. Ela está em uma plateia vendo uma simulação encenada de uma guerra do passado, com canhões, baionetas. Imagine, um passeio com crianças para ver gente atirando em gente, mesmo que seja uma peça e os atores fingem que morrem. O filme tem vários momentos estranhos assim. Achei tudo muito inteligente.
Na última parte Idris Elba é o Presidente e segue para um discurso em um estádio. Ele é retirado as pressas e tem que tomar a decisão de contra ataque ao ataque nuclear a Chicago. É com o presidente que aparece o nome do filme, é uma certa parábola, mas eu achei boba, não embarquei. Boa parte do ódio ao filme vem do final. O filme acaba exatamente ao final da contagem regressiva, não sabemos o que acontece depois e eu amei exatamente isso. Até esse momento ninguém sabe quem está enviando uma bomba nuclear para Chicago. Nenhum país assumiu a responsabilidade. Gostei que o filme não coloca rivalidades nos países, deixando no ar tudo.
Além de ser um filme de ação, fala muito sobre o preparo dos Estados Unidos em momentos de conflito. Tudo é orquestrado. Quem vai ser protegido em bankers, em que momento. Tudo funciona como um relógio. Eles tem que obedecer. O homem que estava ao telefone não consegue ir pra sua sala pra continuar na reunião virtual, ele é levado para um bunker. O filme incomodou o Pentágono, mas alguns relatam que foram pessoas que conheciam muito os sistemas de segurança e que ajudaram na construção do filme. Eu fiquei muito impressionada e é o mais fascinante do filme.

Beijos,
Pedrita

sábado, 15 de novembro de 2025

Os Assassinos de Buckingham

Assisti Os Assassinos de Buckingham (2023) de Hansal Mehta na Netflix. Assim que vi um filme com Kareena Kapoor, o algoritmo começou a me mostrar filmes com ela. Escolhi esse e gostei bastante.

A protagonista sofreu um grande trauma, seu filho pequeno foi assassinado. Começa ela no tribunal ouvindo o depoimento do assassino. Ele diz que não suportava ver pessoas sorrindo, felizes, e é esse o tom do filme. Desigualdade sociais que provocam violência, vícios e maldades. Arrasada, ela resolve pedir transferência pra outra cidade. Ela era a chefe, mas aceita ser subordinada, só pra sair da cidade de onde vive e das lembranças.
Logo que ela chega é designada para um assassinato de um adolescente. Ela pede pra não cuidar do caso, ela vai ser colaboradora do investigador, mas não tem jeito, são ordens. O investigador logo chega a conclusão de quem foi, revolta a cidade, mas ela não se conforma com a rapidez, acha que tem pontas soltas. Ela levanta mais alguns dados, mostra para o chefe e passa a poder investigar. É uma história muito triste.
Beijos,
Pedrita

sexta-feira, 14 de novembro de 2025

Madame Durocher

Assisti Madame Durocher (2024) de Dida Andrade e Andradina Azevedo no TelecinePlay. Eu procurava o que ver nesse streaming e me deparei com esse pôster. Gosto demais da Isabel Filardis e da Sandra Corveloni. E que grata surpresa! É mais um filme histórico brasileiro!

Esse conta a história de Marie Josephine Mathilde Durocher, a primeira parteira brasileira, formada pela Academia Imperial de Medicina.

Durocher veio ao Brasil com sua mãe (Marie-Josée Croze) quando tinha 7 anos. A mãe tinha uma loja na rua do Ouvidor. O filme diz que a história é real, mas alguns personagens e diálogos são ficcionais. Imagino a dificuldade para levantar as informações. A mãe de Maria morre cedo, ela se casa e tem um filho, na biografia falam em dois filhos. O marido (Armando Babaioff) é assassinado por um matador por engano. É quando Maria vê que a Academia Imperial de Medicina abriu vagas para mulheres para o curso de parteiras, ela é a única mulher a se inscrever. Nesse período, Durocher é interpretada brilhantemente por Jeannie Boudier. No filme ela e a mãe tinha duas escravas que são alforriadas e a personagem da Filardis continua com a família. Maria promete pagar salário assim que puder.
André Ramiro interpreta Dr. Joaquim, Joaquim Cândido Soares de Meireles, filho de cirurgião e médico. Ele é grande aliado de Durocher. Ainda aparecem no elenco: Nelson Baskerville como Dom Pedro II, Mateus Solano faz o médico que dá aulas de parto. E ainda Thierry Thémouroux, Fernando Alves Pinto, Adriano Toloza e Clara Moneke.

Sandra Corveloni interpreta Durocher mais velha, até o final de sua vida. A parteira mudou logo suas roupas para saia longa e com visual mais masculino, ela dizia que era mais confortável para a função de parteira. Há várias especulações do motivo da mudança da roupa, certeza só mesmo pela maior facilidade no trabalho. Seu filho morre na Guerra do Paraguai. Durocher fez o parto da Imperatriz Tereza Cristina. Contrariando as estatísticas de expectativa de vida, Durocher morreu com 84 anos.

Beijos,
Pedrita

quinta-feira, 13 de novembro de 2025

Vigília de Jorge Enciso

Vi a exposição Virgília de Jorge Enciso na Galeria Leme. Infelizmente perdi a abertura, fiquei encantada com o belíssimo trabalho. A curadoria foi de Tiago Sant´Ana, outro artista que gosto muito e comentei aqui. Jorge Enciso é de Assunção, Paraguai.
 

Obras Espiritu Curvado (2025) e Curvas de lo invisibile de Jorge Enciso

Eu fiquei encantada com as 24 esculturas em cerâmica. E a montagem está igualmente linda. Como as obras combinaram com o espaço.
Obra Evidência (2025) de Jorge Enciso
Obras Lengua de un corazon antiguo I e II

A mostra Vigília de Jorge Enciso é gratuita e fica em cartaz na Galeria Leme até 18 de dezembro.


Beijos,
Pedrita