sexta-feira, 5 de agosto de 2016

Liberdade Liberdade

Assisti a novela Liberdade Liberdade (2016) de Mário Teixeira na TV Globo. A direção foi de Vinícius Coimbra. Impressionante! Maravilhosa!

Inicialmente conta um pouco a história de Tiradentes interpretada pelo Thiago Lacerda. Sabe-se que na época do seu enforcamento ele tinha uma filha, mas nada mais se sabe. Liberdade Liberdade foi inspirada no livro Joaquina, Filha de Tiradentes de Maria José de Queiroz. A Joaquina criança foi interpretada brilhantemente por Mel Maia. Na trama, a menina vê o enforcamento do pai, o personagem do Dalton Vigh tapa os seus olhos e a leva para a proteção, já que filhos de degradados também tinham que ser enforcados.

Logo a trama salta no tempo. Joaquina é uma mulher, interpretada maravilhosamente por Andréa Horta e tem dois irmãos. Só um é filho de sangue do protetor de Joaquina, André, interpretado magistralmente por Caio Blat. E uma irmã negra e forra Bertolezza, interpretada por Sheron Menezes.

Eu sempre presto a atenção em negros em novelas, vi documentários: A Negação do Brasil e Em Quadro. Leio matérias, mas achei que Liberdade Liberdade não ia poder mudar muito já que era a época da escravidão. E não é que Liberdade Liberdade me surpreendeu? Foram muitos negros livres, com papéis importantes. Parabéns ao autor. Ando cansada de autores que o negro só entra na trama para interpretar o negro e não para ser um ator do elenco. Logo no início um oficial português vem como espião da corte para tentar descobrir os inconfidentes, foi interpretado pelo belga lindíssimo Bukassa Kabengele. É uma época de barbáries, quase todos são mortos em combate, o oficial ia matar um inconfidente, mas esse o salvou e salva de novo. Ele deserda, volta marquês depois e querendo casar com uma negra fugida que encontrou. Ela, interpretada por uma  atriz que adoro, a linda Dani Ornellas, também tinha um papel importante, era a melhor garimpeira dos Raposo, embora ainda escrava. 

Ela compra uma escrava na cidade, a alforria para que trabalhasse para ela. A veste decentemente. A atriz é ótima e interpretada por Olívia Araújo que estava no núcleo cômico da novela. Logo ela é vendida para a taberna, mas nenhum dos seus patrões gostavam dela porque ela comia demais. É divertido ela roubando as comidas e comendo com gosto.

Logo  no início desconfiei que seria uma novela pesada, com desfechos trágicos e foi pior do que eu imaginei. Impecável como mostraram a crueldade daquele tempo e dos homens. Logo que Joaquina chega em Vila Rica ela se apaixona por Xavier, um inconfidente prometido em casamento por Branca. Xavier é interpretado pelo ótimo Bruno Ferrari. Ele fazia um personagem muito dúbio. Bom, queria a liberdade, mas faz muito mal aos seus pais. Primeiro mente que estuda medicina na Europa e usa o parco dinheiro do pai na revolução. Se o dinheiro não fizesse falta ao pai, mas fazia e muito. Em dívidas, principalmente dos altos impostos na época, vive com a esposa praticamente a míngua. Xavier volta e descobre a miséria dos pais, mas em momento algum tenta minimizá-la. Não pede aos revolucionários um pouco do que roubavam para ao menos os pais terem mais alimento a mesa. Os pais foram interpretados por Rita Clemente e Mário Borges.

E que personagem do Ricardo Pereira. Bravo ao ator. Um das melhores interpretações de sua carreira. Tolentino era um oficial muito, mas muito mal. Puxador de saco do intendente, fazia qualquer, mas qualquer coisa mesmo para agradar. Caio Blat desde o começo interpretava André, um homossexual e vamos vendo ele ter interesse em Tolentino, mas duvidávamos se o oficial entendia ou se interessava. Mas eles se apaixonam.

Tolentino continua mal e bruto, ao menor sinal de ciúmes entrega o companheiro e melhor amigo, que é levado a forca. Uma das cenas mais fortes da trama. Foi muito bem conduzido esse casal que protagonizaram a primeira cena de sexo entre dois homens na TV aberta. E o texto foi muito inteligente em mostrar a perseguição ao André, só ao André. Caio Blat é um ator adorado pelo seu público. Era um personagem que o público se apaixonou, dedicado as irmãs, a família. O enforcamento mostrou a maldade humana que ainda continua pelos inúmeros assassinatos a homossexuais. Só que André tinha rosto, afeto de muitos. A forma também foi muito bem realizada. O Tolentino carregando André e pedindo perdão. Xavier levando André até a irmã. Não foi mais só um homossexual assassinado, foi um homem que todos amavam. Liberdade Liberdade foi revolucionária e transgressora o tempo todo.
Os casamentos foram maravilhosos! Que vestidos! A Branca da Natália Dill estava maravilhosa, que atriz. Ela infernizava a vida do Xavier. Ela por capricho quis casar de branco, que não se usava na época. Má e impiedosa, seus textos politicamente incorretos eram verdadeiras bombas de arrogância, inveja e ciúmes. Sua mãe não tinha controle sobre seus mandos e desmandos e era interpretada por Chris Couto. Seu pai era um frouxo, interpretado por Genézio de Barros.

Joaquina já se casou como era na época, de bege. Belíssimo vestido também. Os figurinos foram assinados por Paula Carneiro. Gostei muito que banho era difícil na época. Na caracterização sujavam os atores, os dentes. como tomavam pouco banho, repetiam por dias o mesmo figurino. Incrível a direção de arte de Mario Monteiro. Cenários maravilhosos! Fotografia de Ricardo Gaglionne belíssima. Mateus Solano estava em um personagem incrível. Cruel e sádico, ele sofria porque se sentia inferior. Filho de uma prostituta teve a sorte de ser adotado pela família do pai e ter um melhor destino. Mas o sentimento de inferioridade o acompanhava. Assim que Rosa chega na cidade ele a quer. É a única mulher com educação europeia da cidade. Culta, linda, filha de um par do reino, seria uma excelente esposa para um intendente ambicioso, mas acho que amou verdadeiramente Rosa. Mateus Solano estava incrível em seu personagem complexo.

As personagens femininas também impressionavam. Mulheres fortes, a frente do seu tempo. Até mesmo as más como Dionísia, interpretada brilhantemente por Maitê Proença. Ela tinha sofrido muitas agressões e torturas de seu ex-marido que nós não sabemos quem é. Raposo o havia enviado para outro país. E ela era violentamente cruel com os seus escravos e se deitava com o personagem do David Junior que tinha um romance com a escrava interpretada por Heloísa Jorge. O marido aparece depois e é interpretado por Jackson Antunes. A bruxa era interpretada brilhantemente por Zezé Polessa. Uma mulher das ciências, estava sempre estudando os avanços da medicina. Ela sabia que uma pessoa que estava morrendo poderia receber transfusão de sangue, mas que podia morrer imediatamente se os sangues não se aceitassem. 

Lília Cabral era outra que tinha uma grande personagem. Dona de um bordel, ela era revolucionária e mãe do intendente. A prostituição foi tratada com muito respeito em Liberdade Liberdade. As meninas tinham personalidades diversas. Tinha a falsa e má interpretada por Hanna Romanazzi, a que era boa de administração e contas, interpretada por Yasmin Gomlevsky. Yanna Lavigne teve uma grande personagem. Apesar de prostituta, ela era ingênua e doce. Ela engravida, vai tirar, mas desiste. O personagem do André promete assumir a paternidade, mas nós achamos que eles nunca se deitaram, mas sempre ficavam horas no quarto para enganar o pai dele. Mimi, como chama seu personagem, passa maus bocados na trama.


Mão de Luva é outro incrível personagem na trama, tanto que vai ter alguns episódios na internet do começo de seu bando. Marco Ricca estava incrível. Outro personagem que chamou a atenção foi Simão interpretado por Nikolas Antunes. Eles eram os bandoleiros. Mão de Luva era um bandoleiro, temente a Deus e a serviço de vossa majestade.

Rômulo Estrela estava irreconhecível como um mercador e sequestrador de escravos. 

Fiquei triste que Caju ficou pra traz. Ele foi adotado pelo Raposo, vivia com os bandoleiros. Os irmãos o acolheram, mas no final ninguém levou-a a Europa. Deve ter ficado com o Mão de Luva e a Dionísia. Ele merecia um destino melhor, ir estudar na Europa. Uma graça o ator Gabriel Palhares. A correria para finalizar a novela antes do início das Olimpíadas prejudicou os últimos capítulos que ficaram um pouco atropelados e com erros de continuidade. Uma pena! Podiam ter colocado um capítulo maior na segunda no lugar do filme.

O elenco todo é incrível, estou tentando falar de todos. Adoro Juliana Carneiro da Cunha. Inicialmente ela parecia uma mulher boa. Depois parecia que estava com os inconfidentes, mas foi quando o personagem do Gabriel Braga Nunes apareceu é que entendemos os seus propósitos. Ela era uma infiltrada nos inconfidentes, para juntos com eles matar Dom Pedro e ajudar Carlota Joaquina a ser a rainha e o Brasil passar a ser governado pela Espanha. E também apesar da personagem ser culta, ela era preconceituosa, manipuladora e antiquada. Faz um inferno na vida da sua família impondo suas regras. Mais uma mulher forte. Lucy Ramos também fez uma participação como escrava dessa família, terrível o desfecho da atriz.


Todos nós ficamos tristes quando o Raposo morreu logo. Não tão logo, Liberdade Liberdade estava na reta final, mas realmente o desfecho mudou muito com essa morte. Esses três filhos foram sempre protegidos pelo pai. Com a morte eles passam a se atrapalhar e a sofrer muitas provações, a começar pela falta de dinheiro, já que foi roubado pela contador e depois pelo intendente. E Joaquina resolve alforriar todos os escravos, sem se programar. Só na casa ficam dois empregados, mas nas minas de extração, de onde vinha o dinheiro que os mantinham, ninguém ficou.

Bertolezza teve coragem de fugir com o seu amor, o irmão do intendente que era cego. O intendente não autorizava o romance com uma negra. Eles seguem para Lisboa onde ela conhecia muita gente e muito provavelmente viveram felizes. Ele queria viajar o mundo e foi muito bem interpretado por Vitor Thiré. O intendente tinha vergonha de ter um irmão cego. O rapaz fica culto como Bertolezza porque o irmão o esconde em um internato. 


Impressionante também a personagem da atriz portuguesa Joana Solnado, Má, traidora, ela sonhava em ser esposa do intendente, mas trabalhava para ele como serviçal. Ele a menosprezava, mas a usava para seu prazer sexual. Ela alimentava a esperança que em algum momento ele visse que ela era a mulher talhada para ele. E ela estava mais certa que ele. Ele precisava de alguém igualmente sádico e perverso. Os personagens eram muito ricos. Gostei muito dos taberneiros interpretador por Jairo Mattos e Letícia Isnard. Letícia Sabatella fez uma pequena participação como a mãe de Joaquina. O padre que não era padre por Marcos Oliveira. O capataz dos raposos, que homem ruim e traiçoeiro, por Bruce Gomlevsky. Mesmo sobrenome de umas atrizes que fez uma prostituta. Mariana Nunes como a escrava e ex-escrava fiel a família que trabalhava.
Liberdade Liberdade falava o tempo todo de liberdade. Cada personagem queria a liberdade para as suas questões. O cego de seu cativeiro. A bruxa para pesquisar a sua ciência. Os negros. Para que a homossexualidade não fosse crime.  Liberdade de escolha para o casamento. A Dionísia para se libertar do marido. E claro, os inconfidentes Xavier, Joaquina, Virgínia.  Enfim, todos de algum modo desejavam alguma a liberdade e o texto final sobre liberdade é lindo! Bravo a todos!

Beijos,
Pedrita

10 comentários:

  1. Maravilhosa novela. Tb pude acompanhar boa parte da trama. Elenco afiadíssimo e boas interpretações. Aposto no Solano para levar os melhores do ano, assim como a Andreia Horta como melhor atriz.
    Big beijos
    www.luluonthesky.com

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    1. lulu, concordo. não sei como conseguiu acompanhar só boa parte da trama. eu não conseguia perder um único trecho. por sorte gravava quando não ia poder ver. até pq no globo play não passavam o resumo que todo dia passava e eu adorava.

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  2. Não vi. Muito tarde.
    Poderia ter gravado mas esqueci.

    Achei o Bruno Ferrari lindíssimo na novela.
    Andrea Horta é linda e excelente atriz.

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    1. liliane, muitas vezes eu só vi pq gravei. o bruno ferrari é lindo demais e os dois são mesmo muito talentosos.

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  3. Olá Pedrita
    O que dizer desse post????
    Só tenho uma palavra: Perfeito!
    Quero aprender um dia escrever resenhas tão lindas quanto as que vc escreve :D
    Bjs e excelente fds pra ti
    Luli
    https://cafecomleituranarede.blogspot.com.br

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    1. luli, eu queria conseguir escrever sempre mais completo. só qd o tema me é confortável consigo desenvolver melhor. mas quem escreve bem, escreve bem em qq circunstância. não é o meu caso.

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  4. Oi, Pedrita,

    Quero ver esta obra! Acho que o Tiradentes tornou-se tipo um símbolo da eterna problemática brasileira (subtração das riquezas do país e eliminação dos que se opõem a isso)

    Beijoca

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    1. marly, realmente a trama do tiradentes é a cara do brasil.

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  5. Olá, Pedrita.
    Não conferi a produção, mas ouvi comentários positivos inúmeros e muita gente sendo surpreendida. Aliás, o simples fato da valorização de personagens negros já é algo que merece aplausos.

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