sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

O Jogo da Amarelinha

Terminei de ler O Jogo da Amarelinha (1963) de Julio Cortázar. Eu sempre quis ler esse livro. Há anos anotei uma lista de obras que devem ser lidas e lá estava ele. Nunca encontrava em sebos, só achei Os Prêmios que li e gostei muito. Tive uma surpresa na minha última visita ao sebo, eles tinham um exemplar a venda, e apesar de eu ter passado lá há ano atrás, o atendente lembrava-se que eu sempre quis esse livro. Hoje vi que já é possível comprar nas livrarias virtuais, está o dobro do que eu paguei e parece que demoram pra entregar, mas já é possível encontrá-lo. O que comprei não é o dessa belíssima capa, é da editora Cvilização Brasileira.

Obra de Xul Solar.

Eu não gosto de ler sinopses antes de ler livros, já que muitas revelam mais do que deveriam, então desconhecia sumariamente a estrutura do livro. Fiquei maravilhada no início que dizia que o livro permitia várias leituras. Eu segui a orientação inicial. Ler do início até o capítulo 56, que traz o Fim. Depois segui pela ordem sugerida pelo autor, como um Jogo de Amarelinha. Comecei pelo capítulo 73, e a cada final de capítulo lia o que o autor me enviava. Simplesmente genial.


Obra Conceito Espacial (1965) de Lucio Fontana

Nosso protagonista é muito perturbado. Ele tem uma relação doentia com a Maga. É difícil sabermos o que é delírio ou realidade. Fiquei chocada com a presença do bebê. É claro para mim que é filho dele, mas ele sempre se refere a criança, ele nunca assume a possibilidade que é seu filho. Parece que pelo fato dele ter sugerido o aborto, e ela teimosamente não ter aceito, ele está livre agora da responsabilidade sobre eo bebê, deixa de ser seu, mas também pode ser porque sempre acha que Maga o traiu e nunca sabemos o que é verdade ou delírio de sua mente confusa. Tudo em seu raciocínio é perverso, manipulador e cruel. Eles também vivem em pobreza quase miserável.

O Jogo da Amarelinha é um livro muito complexo, com sentimentos muito vastos, do ódio ao amor, posse ao desprezo. Fiquei absurdamente embebida naquela narrativa doentia. Também nada é claro, há inúmeras lacunas, e talvez seja o que faça de O Jogo da Amarelinha mais fascinante, a dúvida. A não certeza de nada. Como se uma mente perturbada nos levasse a diversos caminhos, mas não há certeza de que realmente aconteceram. Devorei avidamente a tortura de seus personagens e pensamentos confusos.

Obra A Lua de Antonio Berni

Seguem trechos da obra O Jogo da Amarelinha de Julio Cortázar, mas merece ser lido na íntegra, várias vezes e com várias construções de ordens dos capítulos:

Encontraria a Maga? Tantas vezes bastara-me chegar, vindo pela rue de Seine, ao arco que dá pra o Quai de Conti, e mal a luz cinza esverdeada que flutua sobre o rio deixava-me entrever as formas, já sua delgada silhueta se inscrevia no Pont dês Arts, por vezes andando de um lado para o outro da ponte, outras vezes imóvel, debruçada sobre o parapeito de ferro, olhando a água.”

“Acostumaram-se a comparar as colchas, as portas, os abajures, as cortinas; os quartos dos hotéis.”

“Por cima ou por baixo, Big Bill Broonzy começou a cantar See, see, rider; como sempre, tudo convergia de várias dimensões irreconciliáveis, um grotesco collage, que era preciso montar com vodca e categorias kantianas, esses tranqüilizantes contra qualquer coagulação demasiado brusca da realidade. Ou como quase sempre, fechar os olhos e voltar para trás, para o mundo, para o confortável mundo de qualquer noite, escolhida cuidadosamente entre o baralho aberto. See, see, rider, cantava Big Bill, outro morto, see what you have done.”


“Em Paris somos como cogumelos, crescemos nos corrimões das escadas, em quartos escuros onde cheira a gordura, onde a gente faz o amor todo o tempo e, depois frita ovos e põe discos de Vivaldi, acende cigarros... todos nós fazemos o amor e fritamos ovos e fumamos, ah!, nem pode imaginar tudo o que fumamos e o tanto que fazemos o amor, parados, deitados de joelhos, com as mãos, com as bocas, chorando ou cantando, e lá fora existe de tudo, as janelas dão para o ar e isso começa com um pardal ou uma goteira, aqui chove muitíssimo.”

Todas as telas são de pintores argentinos.
Música do post: See see rider (A vitrola de Maga é incessante. Seja de noite, seja de dia, seja com criança doente, com vizinho reclamando, está sempre lá tocando, e nós acompanhamos todas as escolhas musicais. Essa música é uma das mencionadas na obra.)


Beijos,

Pedrita

11 comentários:

  1. Não tenho a menor dúvida: trata-se de um grande livro. E um viva para os sebos. E outro para você, uma leitora incansável. Beijos.

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  2. Esse livro me interessou muitíssimo mesmo. VaLeU a dica, Pê! Qunato ao comentário que você deixou no meu blog, eu diria que você está certa só em parte, uma parte bem pequena. Mas longe de mim querer começar um debate teológico por aqui hehehehe, até porque isso não é o meu forte hehehehe. Se você quiser, pode me mandar um e-mail, que eu respondo. Beijos, bom fim de semana!
    aqueta-2.zip.net

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  3. Esse livro é realmente maravilhoso, uma leitura fascinante!

    As imagens do post são lindas, me fizeram lembrar das mostras que eu ia quando morei em Buenos Aires.

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  4. Pela música que eu estou ouvindo agora em seu blog, pelo visto a Maga tem um gosto musical excelente!
    E quanto ao livro, deve ser um jogo de amarelinha mesmo! Só que, pelo o que eu li aí sobre o protagonista, parece que ele não vai chegar no "10", não é? Hehehe!
    Passe lá no meu blog e deixe seu comentário!!!

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  5. Pedrita, uma vez eu vi um documentário sobre a vida de Julia Cortazar. Gostei muito. Mas nunca li um livro do autor. Gostei das imagens do post.

    Beijos

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  6. obrigada moacy, eu gostaria e precisaria de ler mais, mas faço o que posso.

    aqueta, esse livro é muito bom.

    camila, que bom que gostou das telas.

    sim, a maga tem um ótimo gosto musical.

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  7. Vou deixar um comentário mas não li o post, já que também não gosto de ler resenhas. É um livro que está na minha estante (com mais outros 8) para posterior leitura.
    Agora, tenho que ler Neve, já que alguém me emprestou, sabe?
    Denise

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  8. POIS É. Eu também, a anos quero ler e nunca o adquiro. Nas livrarias está os olhos da cara de tão absurdamente caro! Mas consegui num sebo aqui no Catete, RJ. Aliás esse sebo maravilhoso é tudo o que um acumulador de livros deseja! Fiz uma feira hoje! Bjs.

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    1. fatima, bacana. eu comprei em um sebo e nem foi muito barato pq é livro raro aqui infelizmente.

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  9. Não associei a ideia da criança poder ser filha dele, mas tem lógica vendo o comportamento posterior de Maga.
    Eu segui mesmo o guia de Cortázar, me perdi uma vez e depois repus a ordem.

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    1. carlos, eu não me perdi mas não lembro se tinha tempo na época então li de uma tacada só.

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