Terminei de ler
Os Maias (1888) de
Eça de Queirós. Vocês se lembram que eu recentemente vi a minissérie
Os Maias de
Luiz Fernando Carvalho. Minha irmã separou então o livro para eu ler. É exatamente a edição dessa capa da
Ateliê Editorial, capa belíssima, edição primorosa. Eu gosto muito desse escritor, meu preferido ainda é
O Crime do Padre Amaro, mas adoro o seu estilo e suas obras. Mesmo
Os Maias tendo muito do Romantismo, o autor é sempre ácido e surpreendente. Tudo aquilo que parece belo e puro pode em determinado momento se tornar sórdido e medonho.
Obra
Retrato de Uma Mulher Portuguesa (1900) de
Ernesto Ferreira CondeixaOs Maias é um livro extenso que passa em duas gerações pelo menos. Atráves de dois personagens, pai e filho, o autor mostra as diferenças das educações e suas correntes ideológicas. Pedro é criado dentro de todo o atraso da religião, com todo o seu fervor católico e seu atraso intelectual. Carlos Eduardo já é criado pelo avô, dentro da corrente do liberalismo, onde a ciência, a filosofia e a formação intelectual é a base de sua formação. Há ainda uma terceira personagem, Maria Eduarda, que é criada em meio a vida noturna de Paris, muitos amigos, sua mãe tinha muitos amantes e muitos clientes. E por último, Ega, que é filho de uma mãe carola e apesar de renegar todas as suas origens do catolicismo ferrenho, é do dinheiro dela e do seu amigo Carlos que ele vive, porque boêmio confesso, espalha suas ideias e suas transgressões em discursos na vida noturna, mas não transforma nada do que pensa e idealiza em fonte de renda, não escreve artigos, nunca concluiu um livro e está envolvido em confusões. Carlos Eduardo também não precisa trabalhar. Se forma médico, escreve alguns artigos, mas como o próprio Ega diz, com dinheiro aos poucos tudo é possível se esquecer. Com dinheiro é possível viajar, se mudar, conhecer outras pessoas. O dinheiro atenua as tragédias da vida.
Conversei bastante com minha irmã sobre a adaptação para a
minissérie que é belíssima, mas traz algumas pequenas modificações com o objetivo de ficar mais dramático, denso com um pouco de exagero no melodramático.
Marília Pêra interpreta
Maria Monforte nos últimos capítulos da
minissérie, quando
Maria Monforte já não existia mais e tinha morrido do coração, não de tuberculose.
Maria Monforte morreu quando vivia com a filha em Paris. A filha inclusive viveu muito com a mãe, não ficou tanto no convento. Ficou lá só o tempo suficiente dos estudos e sua mãe a visitava com regularidade. A personagem da
Eva Wilma aparece muito pouco no livro, é mencionada muito rapidamente, umas três vezes. O próprio avô do
Carlos Eduardo aparece pouco e ele não é contra o
Carlos Eduardo comprar a casa dos Olivais, não interfere no relacionamento do neto, fica inclusive bem distante dos fatos. O
Ega pede ao
Vilaça que conte ao
Carlos sobre a sua irmã, e o
Vilaça acha um horror aparecer naquele momento mais um herdeiro para dividir a herança. Pouco se incomoda com a revelação do parentesco dos dois e repete umas três vezes que é uma maçada a herança ser desmembrada. Tanto que
Maria Eduarda recebe pouco do que lhe cabe. Ela não quer a herança, mas mesmo assim, o
Vilaça só passa uma boa quantia, mas muito aquém do que ela realmente tinha direito. A espanhola teve alguns momentos com o
Carlos Eduardo no período da faculdade, muito rapidamente. Não aparece depois e nem tampouco lê a mão de
Carlos e fala da mulher que não era casada.
Eusébiozinho e sua irmã aparecem muito pouco, ela menos ainda. Ele ainda aparece um pouco, mas não tanto quanto na minissérie. As festas de
Maria Monforte são somente mencionadas muito rapidamente. E
Carlos não vai se despedir da irmã quando ela vai partir na estação de trem. Assim que toda a história trágica aconteceu,
Carlos Eduardo viajou com o
Ega para a América do Norte e depois passaram por uns dez anos viajando pelo mundo. É quando voltam para Lisboa, para o Ramalhete e então que acontecem aquelas cenas iniciais da minissérie. Mas não parece pela caracterização dos dois que dez anos haviam se passado. A sensação é que a minissérie carregou um pouco a mão no melodrama. Apesar das diferenças, a minissérie é impecável e belíssima!
Obra
Vista da Penha de França, Lisboa (1857) de
Tomás d'AnunciaçãoAnotei alguns trechos de Os Maias de Eça de Queirós:
“A casa que os Maias vieram habitar em Lisboa, no outono de 1875, era conhecida na vizinhança da rua de S. Francisco de Paula, e em todo o bairro das Janelas Verdes, pela casa do Ramalhete, ou simplesmente o Ramalhete.”
“Assim acontece com as estrelas de acaso! Elas não são duma essência diferente, nem contêm mais luz que as outras: mas, por isso mesmo que passam fugitivamente e se esvaem, parecem despedir um fulgor mais divino, e o deslumbramento que deixam nos olhos é mais perturbador e mais longo...”
“Ega declarou muito decididamente ao Sr. Sousa Neto que era pela escravatura. Os desconfortos da vida, segundo ele, tinham começado com a libertação dos negros. Só podia ser seriamente obedecido, quem era seriamente temido... Por isso ninguém agora lograva ter os seus sapatos bem envernizados, o seu arroz bem cozido, a sua escada bem lavada, desde que não tinha criados pretos em que fosse lícito dar vergastadas... Só houvera duas civilizações em que o homem conseguira viver com razoável comodidade: a civilização romana, e a civilização especial dos plantadores da Nova Orleans. Por quê? Porque numa e noutra existia a escravatura a sério, com direito de morte!...”
As duas telas são de pintores portugueses e foram realizadas no período que o livro foi publicado.
Beijos,
Pedrita