Terminei de ler Brava Serena (2018) de Eduardo Krause da Dublinense. Eu vou há anos na banca da editora na Festa do Livro da USP e Eduardo Krause foi um grande anfitrião vários anos. Agora ótimos outros vendedores estão no lugar dele. Na primeira vez fui buscar um livro do José Luiz Peixoto. Ótimos vendedores, saí de lá com vários, e muitos entre os melhores livros que já li na vida como No Fundo do Poço de Buchi Emecheta. Eles viram que eu adoro obras de escritoras e a editora tem vários, me indicaram alguns. Até que uns anos depois descobri que o livreiro tinha obras publicadas que eu ignorava sumariamente. Resolvi corrigir essa falta e descobri essa preciosidade.
O marcador de livro é parte de um calendário bem antigo e amarelado, com imagens de Roma, que alguém me enviou pelo correio.
E por que Marcello Mastroianni na capa e agora no pôster? Porque o personagem era a cara dele. Como ele dizia, o Mastroianni dos últimos filmes. O personagem se incomodava muito que as pessoas só lembravam sempre de um ou dois filmes com ele, sempre os mesmos. Escolhi I Girasoli de Victtorio de Sica, com outra grande e deslumbrante atriz, Sofia Loren, ainda Sofia, sem o atual Sophia. Entre meus filmes preferidos. Eu cantava a música ao piano, tocava depois também. O Mastroianni brasileiro viaja para Roma. Ele ainda é jovem, mas se considera um idoso com pouco mais de 70 anos. Ele quer reviver todos os locais que passou com sua linda e adorada esposa Alice, já falecida há décadas, mas isso vamos descobrindo aos poucos.
Roberto se hospeda em um prédio cheio de quartos onde moram as proprietárias Serena e sua mãe. É nas madrugadas que assiste o programa apresentado por Ambra Angiolini (foto), conhecida pela T´appartengo. Roberto e Serena ridicularizam a breguice da música que estou viciada. Experimentem também a versão de Ebbanesis. As duas tem no Spotify. Ambra era a cara da esposa de Roberto. Brava Serena é um livro sensorial. Parecia que eu andava com eles por Roma, pela Itália, pela gastronomia, pelos cinemas, filmes, música. O que não faltam são pratos e mais pratos de guloseimas, regados a muito vinho. É um livro de sensações, sentimentos e profundamente cinematográfico. Daria um belo filme ou série.
La Dolce Vita é um dos filmes que o protagonista não aguenta mais que mencionem. O livro é uma delícia! E profundamente surpreendente no final. Sim, eu já tinha ideia que ia para algum caminho parecido, mas jamais imaginei os desdobramentos, brilhante. É um delicioso livro pra ser levado como companheiro em viagens.
Espero que eu não frustre o autor com um texto tão simples com sua obra e com ilustrações bem diferentes das tradicionais obras de arte que ele tanto gosta.
Assisti Uma Família Feliz (2022) de José Eduardo Belmonte no Telecine Premium. Apesar do cartaz anunciar que o filme entrou no streaming, isso ainda não aconteceu. Tive que ver voltando pelo controle remoto. O roteiro de Raphael Montes é inacreditável! Que filme desconcertante! A direção criou tanta tensão que o filme é praticamente de terror. Eu vi sem ler nada, só sabia que não era uma família feliz.
Começa com a personagem da Grazi Massafera enterrando uma criança, pegando o carro com outra e provocando intencionalmente um acidente. O filme vai para o passado e vamos tentando entender o que aconteceu. Grazi está impressionante! Que atriz! O personagem dela é muito, mas muito complexo. Reynaldo Gianecchini é o pai dedicado. E como é grosseiro com a esposa. Ele não perde um momento que seja pra diminuí-la.
Pra piorar ela engravida e tem um bebê. Como toda mãe nessa situação, ela está sempre sonada. E a mãe parece que tem depressão pós-parto, mas ninguém parece pensar ou conversar sobre isso. Eles tem uma vida bem confortável. A mansão é belíssima! Mas o pai o tempo todo diz que não é possível contratar ajuda e sugere que a esposa largue o trabalho dela. Ela é artesã, faz bonecas que parecem bebês de verdade, é reconhecida, já teve matérias sobre o trabalho, mas ele diz que ela fica brincando de boneca. Reynaldo Gianecchini também está ótimo. O bebê e a filha aparecem machucados, a irmã diz que foi a mãe, começa então o inferno dessa mãe, mas a gente não sabe em quem acreditar. A mãe começa a desconfiar do marido.
A inabilidade dessa família pra lidar com os conflitos é irritante. Primeiro porque antes mesmo do bebê nascer, uma das filhas já tinha uma grave doença. E ninguém faz tratamento com terapeutas, nem as filhas, nem os pais, pra lidar com a doença. Então quando a violência aparece na família, há silêncios, falta de diálogo. É um horror! As meninas são Luiza Antunes e Juliana Bim. A vizinhança também é pavorosa. Mesmo sabendo que há crianças na casa, não pensam duas vezes em provocar violências com a família e vulnerabilizar ainda mais os filhos. Que filme!
Assisti ao recital de Alexander Gadjiev no Festival Chopin na Sala São Paulo. Que concerto! Que pianista! Foi lindo demais! O festival traz sempre pianistas laureados no Concurso Chopin de Varsóvia. Alexander é ítalo-esloveno.
No repertório além de Chopin ele interpretou Liszt, Scriabin e Beethoven. Uma das obras do bis foi uma belíssima Debussy.
Programa completo
F. Chopin (1810 -1849)
Noturno Nº1 em Fá maior Op.15
Prelúdios Op. 28
Nº 23 em Fá maior
Nº 22 em Sol menor
Nº18 em Fá menor
Nº13 em Fá sustenido maior
Scherzo nº3 em dó sustenido menor Op.39
Mazurkas
Op 68 nº 3 em Fá menor
Opus 24 nº2 em Dó maior
Opus 50 nº3 em Dó sustenido menor
Opus 6 nº1, em Fá sustenido menor
Opus 63 nº3 Dó sustenido menor
Polonaise em Lá menor Op. 53 ( Heróica)
F.
Liszt ( 1811-1886)
Funerais S173 Harmonias Poéticas e Religiosas
A.
Scriabin (1872- 1915)
Sonata nº9 Op.68
L. Van Beethoven (1770 – 1827)
Variações da Heróica em Mi bemol maior Op. 35
Alexander Gadjiev foi o primeiro pianista a se apresentar no Festival Chopin. Terão mais 4 pianistas na programação, 3 se apresentam na Sala São Paulo e um no Theatro Municipal de São Paulo. Eu amo esse festival! Tem no Spotify uma playlist Festival Chopin 2024.
Assisti Jantar com Beatriz (2017) de Miguel Arteta no Star na Disney. Não entendi porque esse filme está em comédia. O roteiro é de Mike White. O diretor nasceu em Porto Rico.
O debate do filme é urgente, Salma Hayek está ótima, a construção do filme é mais ou menos. A protagonista é uma profissional da saúde alternativa. Ela tem o dom de acalmar e energizar pessoas, então trabalha em uma instituição que trata de pessoas e crianças com câncer. O filme se passa em um único dia. Muito sensível, ela está sofrendo muito porque mataram sua cabrita. Ela tem um carro velho, uma vida financeira mais ou menos e atravessa a cidade para ir a casa de uma milionária que a adora. A dona da casa, Connie Briton, é muito grata a tudo o que a profissional fez a sua filha que está em tratamento de câncer. O carro da profissional não pega na hora de ir embora, então a dona da casa sugere que ela participe do jantar de negócios que seu marido promove.
Como acontece com pessoas milionárias, os convidados são descolados da realidade. Com egos inflados e por serem idolatrados no grupo, se vangloriam dos horrores que praticam como se fossem troféus. Li que o diretor tinha ficado horrorizado com aquele homem no safari que tirou a foto armado ao lado de um animal abatido. Então o milionário convidado, John Lithgow, faz exatamente isso, mostra no celular um rinoceronte que abateu e conta que vai novamente caçar no safari na África do Sul. Li que o filme foi feito antes de Trump chegar ao poder e que o filme acaba espelhando muito dos horrores que os Estados Unidos e os imigrantes viverem nesses tempos escuros.
A jovem fica horrorizada no jantar. Claro que ela é vegetariana, toda preocupada com o meio ambiente, com o planeta. Mesmo antes da foto ela se confronta com o milionário. Eles passam a travar um verdadeiro duelo, como a caça e o caçador, e eles se alternam nos papéis de presa e algoz. O milionário enriqueceu com especulação imobiliária. Poderoso e cheio de dinheiro derrubou matas, casas, para enriquecer mais a si e aos outros. E é aplaudido o tempo todo no jantar. Todos ficam constrangidos com a jovem atônita. Ela é mexicana e acha que foi esse milionário que destruiu as terras onde ela e seu povo morava. São horríveis as perguntas dos convidados a jovem, se ela está ilegal no país, se ela tirou emprego de alguém, se colabora economicamente para o bem do país e como se eles fossem donos do país e não só mais um habitante na terra. Como se só pudesse estar lá se contribuísse como uma imigrante regularizada. Eu fiquei imaginando como o filme terminaria, estava difícil imaginar um desfecho. Parece que o diretor teve a mesma dúvida. As soluções são estranhas. Os milionários cometendo crimes ambientais soltando balões e a jovem se matando no mar.
Assisti Falas de Acesso (2014) de Pedro Henrique França e Daniel Gonçalves na Globoplay. A direção artística é de Patrícia Carvalho. Assim que começaram as chamadas na TV Globo quis ver. Consegui ver depois na Globoplay e continua disponível por lá. É daqueles documentários que queremos que todos vejam.
A estrutura do programa foi muito inteligente. Teve vários estilos de quadros. Gostei muito os que promoviam experiências. Em um restaurante totalmente adaptado e lotado de deficientes, recebeu pessoas sem deficiência que são tratadas muito semelhante como os deficientes em geral são tratados. Pra piorar o desconforto deles, tudo é adaptado, então não tem cardápio pra pessoas sem deficiência. Muito chocante quando um deficiente pede self a uma pessoa que não tem deficiência porque o filho vai adorar e que ainda dá engajamento. Constrangedor! Um falou com voz de criança, infantilizando a pessoa. Foram várias situações constrangedoras. Adorei ver a atriz de Todas as Flores, Camila Alves no especial. Ela falou sobre cães guias, sobre a lei e a forma como a lei é sistematicamente desrespeitada. Quero ver logo a atriz novamente em cena.
A jornalista Flávia Cintra foi a apresentadora onde falou de leis, estatísticas. Samantha Quadrado também participa com seu marido Breno Viola. Eu gosto demais das postagens dela no instagram e como é linda. Dois outros quadros vivenciavam momentos. O famoso cafezinho na empresa e as conversas "descontraídas" com Daniel Gonçalves e Eduardo Sterblich. E cumprimentos de casamento entre um cadeirante e sua esposa. Letícia Colin faz a preconceituosa convidada. O cadeirante comenta com o público como a convidada o ignora, a convidada elogia a noiva pelo gesto de casar com o cadeirante. Que desconforto que sentimos!
A influenciadora Tatá Mendonça participou de um quadro onde ela dizia que o recurso para ouvir as mensagens do celular não estava funcionando, se a pessoa podia ler pra ela os comentários, que eram discursos de ódio. Todos ficam constrangidos com os horrores que escreviam pra ela. Esse exercício é ótimo. Se ver alguém destilando ódio, peça pra ela ir até a pessoa e repetir presencialmente. Nem todos vão perceber, mas vários na hora vão se sentir constrangidos. Parece que escrevendo pode. Discurso de ódio não é liberdade de expressão.
Pedro Henrique França vem se especializando como documentarista. Está sempre em projetos incríveis. Comentei sobre dois deles aqui.